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* Fúria

Gênero: drama/romance

Sinopse: Renan esconde um segredo que Valentina nem pode imaginar. Após ele desaparecer no meio da noite, sem deixar pistas do seu paradeiro, finalmente depois de três meses de procura intensa na cidade de Hamamatsu, Valentina descobre que ele mudara-se para outra cidade. Será que seu amor resistirá à dura prova do abandono?! Ou não?! E também: o que fez com que ele desaparecesse sem ao mínimo avisá-la?! Terá sido por outra mulher?! Descubra as respostas em “FÚRIA”; um conto repleto com tensões conjugais, mistérios de tirar o fôlego, e com revelações surpreendentemente sentimentais.

Fúria (amostra)

Sem que Renan estivesse esperando, Valentina apareceu em seu apartamento como um furacão. Ela chegou como chegam às chuvas tempestivas sobre uma noite calma, ou como chegam às ventanias frouxas que se encorpam e logo se transformam em grandes ventanias soltas. De longe era possível ouvir os roncos do motor potente do Camaro adentrando a área do estacionamento do edifício; os pneus derrapando por cima do cascalho, as pastilhas do freio só parando de chiar, quando enfim um estrondo emitido por um agressivo fechar de porta, denunciou a extrema fúria que o habitava. 

O ambiente do condomínio, antes calmo e pacato, agora estava sendo molestado por um vozerio de resmungos somado a sequenciais passos descompassados, pisoteando com agressividade as escadas e o corredor, emitindo negativas vibrações que substituíam os resquícios das últimas, ou seja, aquela emanação sonora do motor que se extinguira de vez, por baixo do capô amarelo e robusto do automóvel.

 Chegando à porta do apartamento de Renan, Valentina tacou logo os dedos na campainha. Apesar de Renan demorar quase que um século para atendê-la, ela segurava o impulso de gritar pelo seu nome corredor a fora: fechou os olhos e, respirando e inspirando profundamente enquanto o aguardava, mantinha as unhas de porcelana subindo e descendo, descendo e subindo, sequencialmente iniciando do dedo mindinho ao indicador, martelando as unhas afiadas no corrimão de metal às costas. Mas momentos após, angustiada por esperar, elevou o dedo de volta ao botão, apertando-o com agressividade.

“Renan, você me paga!”. — Ela sussurrou. Ela permanecia com o corpo rente a porta do apartamento; o rosto deformado, expressando um semblante sofrido sobrevivendo à mente naufragada em pensamentos desfavoráveis. Desde que descobrira seu novo endereço, Valentina estava sequestrada por grossas nuvens negras que orbitavam toda a beleza da história que um dia, pelo menos ela pensou, sinceramente pensou ter construído com Renan, o então namorado. E, naquela manhã fatídica, ela vinha de longe. Para ser mais exato, ela vinha de Hamamatsu. Agora, vou desvelar a história, e a história é assim; pois assim que ela descobriu por onde Renan andava, ou melhor, para onde ele tinha-se mudado sem avisá-la, ela burlou o trabalho com uma desculpa qualquer, e partiu porta afora; sequer expressou remorso na mentira escrita no papel jogado às pressas sobre a mesa da secretária.

Mas assim que seu veículo adentrou o perímetro urbano da cidade de Nagóia, ela sentiu o coração estremecer. Suas emoções, antes naufragadas de saudades por Renan, agora, naqueles poucos minutos que restavam até sua residência, vertia-se em grossos filamentos de lágrimas que a todo o instante tirava-lhe o foco do volante, dos outros carros e da estrada.

“Ah, que saudades de você, seu canalha!”. — Era o que, no fundo do seu coração, ela queria dizer, mas não conseguiu dizer assim. Apenas resmungos eram bufados, enquanto passava marcha a marcha, o ronco do motor cada vez mais alinhado com a raiva crescente. 

Apesar dos contrastes, Valentina estava linda e exuberante. E, ainda que estivesse falando sozinha, bufando de raiva ou encenando olhares amendoados enquanto aguardava a porta se abrir, seus cabelos ruivos perfaziam o mesmo penteado; precisamente amarrados para trás, sem um único fio de cabelo fora do lugar, acentuando ainda mais o charme do rosto angelical pipocado de sarnas. Sem mencionar a jeans apertada, avolumando a beleza exótica que homem algum, estando em sã consciência ou não, jamais deixaria de reparar.

— O que veio fazer aqui?! — Renan vociferou assim que a viu rente a porta do apartamento.

— Por que você sumiu sem dizer nada?! — Valentina respondeu, mas em seguida, vacilou o corpo para trás, sentindo-se acovardada com a reação de Renan.

 — Eu precisava de um tempo. — ele disse. Sua voz rangia. — Um tempo daquela cidade, daquelas pessoas, de você...

— De mim?! — Ela retorquiu — Só o que eu fiz foi te amar...

— Amar?! — Ele exclamou. E ao dizer isso o corpo de Renan demonstrava princípios de um nervosismo que não iria desvanecer tão cedo — Não me venha com essa, Valentina — ele tornou a dizer — você não sabe o que é amar.

— Não diga isso, bebê... — Ela sussurrou. E ao dizer isso, Valentia parecia já estar divorciada dos sentimentos que a levaram até ali.

— Não me chame de bebê! — Renan exclamou com indignação. E, como alguns vizinhos aportaram no pátio, se dirigindo às escadas para subir, ele se conteve e suprimiu o que iria dizer em seguida.

— Desculpe-me, Renan. — Valentina voltou a falar — Pensei que você gostava quando eu te chamava assim...

— Eu gostava de ouvir, — ele retorquiu — só que não nestas circunstâncias. Depois de dar voltas no olhar para ver se os vizinhos tinham sumido de vista, tornou a dizer: — Estamos brigando, esqueceu-se?!

Ao ouvi-lo dizer contradições, o coração de Valentina apaziguou-se. Percebeu nele um princípio de reconciliação subjetiva por trás de toda aquela recepção.

— É verdade, Renan, — ela disse em sussurros — estávamos brigando... — Em seguida, foi possível perceber um sorriso maroto brotando no cantinho esquerdo da sua boca. 

— Estávamos não, — ele corrigiu — ainda estamos. Ao dizer isso, Renan abriu um pouco mais a porta, destravando o pé que mantinha travando o portal.

— Você tem razão, — ela disse, corrigindo-se — ainda estamos brigando. Mas você há de concordar comigo que todo casal, quando se ama de verdade, briga. 

— Ah, — zombou Renan — Não me venha me falar de amor, ok? 

 — Por quê?! — Ela exclamou. Seu rosto demonstrou indignação. — Por que não devo falar de amor?!

— Por quê?! — Ele exclamou com tom de sarcasmo. — Você ainda pergunta Valentina, sério isso?!

Ao palmilhar um terreno aparentemente mais doloroso para ele, Valentina decidiu por se conter mais ao falar. Afinal, qualquer palavra que dissesse estando fora do lugar, poderia de fato, quebrar o clima de reconciliação que Renan vinha cooperando sem perceber. Mas impulsionada pela ansiedade, ela arriscou-se a dizer: 

— Brigamos porque nos amamos, Renan. Quem não briga, não tem interesse em melhorar a relação. Ou demonstra, pelo menos de certa forma, que já deixou de se importar com o outro.

Renan franziu o cenho ao ouvi-la. Depois disse, com os olhos fincados nos seus — É sério que logo você quem está me falando estas coisas?!

— Por quê? Não acredita mais em mim? — Ela retorquiu desacreditada. Mas em seguida, com o olhar sutilmente enviesado para Renan, ditou palavras com leves toques de sarcasmo: 

— Ah, esqueci-me que foi você que me abandonou... 

— Eu te abandonei?! — retorquiu Renan. Em seus olhos era visível perceber certa segurança ao argumentar.

— É, — ela exclamou com desdém — quando uma pessoa some no meio da noite, sem avisar aonde vai, isso é abandonar, Renan! 

Tentando evitar recordar-se daquela noite, Renan desviou os olhos de Valentina. Fincou o olhar no horizonte — É, — ele sussurrou depois de um tempo. Em parte, parecia se sentir culpado — Foi exatamente isso que fiz com você... Eu te abandonei.

Crendo que, enfim seus argumentos enfraqueciam um Renan agora retraído ao falar, Valentina, com propósito único de nocauteá-lo de vez, e quem sabe, reatar o relacionamento logo de cara, continuou a relembrar coisas antigas, sem em nenhum momento deixar espaços para que ele pudesse raciocinar direito.

 — Você sumiu no meio da noite, Renan. — ela disse — Não avisou aonde ia. Sequer me telefonou. Quando cheguei do trabalho, te procurei como doida, por todos os lados, fiquei louca, telefonei pra todo mundo que te conhecia. Não despreguei do telefone...

Em silêncio, Renan ouvia-a retroceder ao passado, enquanto em sua mente, chafurdava desentendimentos antigos, vividos entre os dois. Mas ele ainda permanecia com o pé travando o portal. 

 — Está me entendendo Renan?! — Ela disse, sem saber que ele estava em transe.

De fato, Renan não estava mais ali. Seus pensamentos orbitavam outro lugar. Pois aquele zunido que já durava trinta minutos de um zum-zum-zum frenético, fez sua psique adormecer; os pensamentos acovardaram-se e, totalmente oco, a única coisa que restava foi fazer “cara” de quem a ouvia.

— Está me ouvido Renan?! — Ela repetiu a pergunta. Valentia mantinha as mãos na cintura. Mas a forma que ele se comportava, ou seja, expressando aquele olhar opaco, distante e desinteressado, lhe tirou do sério. 

Foi só quando Valentina perguntou pela terceira vez: — Está me ouvido Renan?! — foi que ele foi importado daquele seu “mundo” particular. Disse baixinho:

— Eu necessito de paz...

— O que disse?! 

Renan suspirou, olhou em seus olhos, e falou novamente, só que num tom mais alto.

— Eu necessito de paz... 

— Como é que é?! — Exclamou Valentina. E antes que ela pudesse argumentar coisas de volta, Renan a interviu. Só que dessa vez ele foi bem grosso:

— Eu não te amo mais.

Então, toda a segurança que, a princípio a inflaram para argumentar coisas antigas, em um piscar de olhos minguaram de vez do seu rosto. Silenciou-se. E, quando por fim assimilou o significado real na junção das palavras que ouviu, o que restou no seu coração foi um misto de insegurança e medo, somando-se a um princípio de desespero. 

De tudo o que ouviu de Renan naquela manhã, o que de fato insista martelar em sua mente era: “Eu não te amo mais!”. Isso lhe arrancou o chão. Mas depois de um tempo digerindo o que acabara de ouvir, ela mudou de postura. Alteou o olhar. Ela mantinha o corpo encostado na pilastra às costas e, a bolsa Prada que tanto amava estava jogada ao chão, molestada pelo palmilhar do salto alto. 

— Qual é mesmo “aquele nome” que você gostava de me chamar, Renan? — Valentina disse. Foi muito sexy a mordida que ela deu no cantinho dos lábios.

— “Aquele nome?” — Ele desconversou. Mas a postura corporal de Renan denunciou que ficou interessado no assunto. 

— É! — Ela disse, como que o ajudando a recordar-se — Aquele nome que, sempre que a gente estava, bem, você sabe... 

Depois de sacar o que estava rolando, Renan lhe respondeu, ainda que, resistindo à própria voz vibrando indícios de excitação:

 — Ah, por favor, Valentina, não começa. — ele disse — Creio que o momento não é adequado, né?

— Desculpe Renan, — Ela sibilou, mas não demonstrou constrangimento ao falar. E em seguida, com os olhos amendoados, tornou a insistir com ele — Eu concordo com você. E sei que é uma pergunta boba, talvez inadequada, mas veja bem, é só uma pergunta, Renan. Respondê-la não vai arrancar nenhum pedacinho de você, vai?

— O que está tramando, hein? — Ele disse. Sua sobrancelha sobressaindo à outra.

— Tramando?! — Ela indagou permanecendo com o mesmo dengo na voz — Não estou tramando nada, juro. Só quero te ouvir falar, Renan, nem que seja só mais desta vez. Depois de ouvi-lo, juro que saio da sua vida pra sempre. Nunca mais irá me ver...

Alçado majestosamente no topo da sua segurança pessoal, Renan, sem perceber, estremeceu ao ouvi-la dizer aquelas últimas palavras. De fato, ele permanecia, pelo menos desde o início do encontro com Valentina, firme e ancorado nas mágoas que ainda refletiam sofrimentos diversos relacionados à vida que vivera com ela. Mas ao ouvi-la dizer o conjunto das palavras: “pra sempre”, e “nunca mais”, algo dissolveu dentro de si. 

— Valentina, veja bem... — ele disse — Também não precisa falar desse jeito — Em seguida afrouxou a mão da maçaneta.

Continua...

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